Por trabalhar na Justiça Eleitoral, evito citar nomes de políticos e/ou partidos políticos brasileiros (embora eu pudesse fazê-lo sem problema algum, pois sou um cidadão como outro qualquer: o Código de Ética do TRE/RJ não tem vedação nesse sentido, porque o fato de ser servidor público não retira minha liberdade de expressão).

domingo, 31 de março de 2013

Os números da violência doméstica contra as mulheres no Brasil (parte 2)

AVISOS AOS NAVEGANTES

1 - Sou contra todas as formas de violência, qualquer que seja a vítima, homem ou mulher. 
2 - Para mim o homem que agride uma mulher baseado na ideia absurda de que ser superior a ela é um idiota e merece encontrar um irmão, pai ou outro parente que diga "bate em mim agora: você não é machão?", para largar de ser covarde: lugar de criminoso é na cadeia.
3 - Ensino meus filhos a serem gentis com as mulheres e que "em mulher não se bate nem com uma flor", além de outras regras de boa educação: desde que o mundo é mundo é assim.
4 - A postagem abaixo é séria, embora eu não seja especialista no assunto. Nela indico todos os links que mostram de onde vêm as fontes citadas e de onde tirei as conclusões apresentadas. Por gentileza leia até o fim antes de emitir algum conceito pré-estabelecido a respeitoem momento algum direi que não há violência contra a mulher.



Os números da violência doméstica 
contra as mulheres no Brasil (2)


Esta é a segunda parte da postagem que foi ao ar ontem e pode ser lida aqui.


No dia 08 de maio de 2012 a jornalista Adriana Ferraz publicou no jornal O Estado de São Paulo reportagem intitulada "cada duas horas, uma mulher é assassinada no País(leia)O Instituto Patrícia Galvão (aqui) também cita em seu site a pesquisa abaixo, usada como base para a reportagem, além de mostrar uma interessante pesquisa sobre como as pessoas percebem a violência contra a mulher :

"A cada duas horas, uma mulher é morta no Brasil. Na maioria dos casos, o assassino é o namorado, marido ou ex-companheiro, que mata dentro de casa, após já ter cometido pelo menos um ato de agressão. Os dados constam do Mapa da Violência de 2012 - Homicídio de Mulheres"

Assim, pesquisei no site do Instituto Sangari, que elabora o "Mapa da Violência no Brasil", porque foi de lá que saiu a informação que eu buscava. Está lá na página 66 do Mapa da Violência 2012, item "2.4.2 - Homicídios e Gênero":

"Dos 49.932 homicídios registrados, 45.617 pertenciam ao sexo masculino (91,4%) e 4.27331 ao feminino (8,6%). E, historicamente, essas proporções não mudam praticamente de ano um ano para outro. Ainda assim, apesar dessa baixa participação, nas estatísticas recentes morrem acima de 4.000 mulheres anualmente vítimas de homicídio."

Tá, deixemos de lado o fato de que 91% dos assassinados no Brasil são homens, pois  ninguém parece se importar com isso. Se os números se mantém relativamente estáveis e se no ano de 2010 foram mortas no Brasil 4.297 mulheres, dividindo-se tal número por 365 dias chegamos à média de 11,7 mulheres mortas por dia no país todo a cada dia, o que gera a média de uma mulher morta a cada duas horas aproximadamente.

Foi daí que saiu a tal frase... mas ninguém diz que 
o instituto analisou os homicídios em geral, não especificamente os praticados em razão de violência doméstica. Ninguém diz que foi feita uma generalização absurda: as mulheres mortas por traficantes, em assaltos, por outras mulheres e vítimas da violência em geral entraram todas na "estatística" e isso virou um mantra, eternamente repetido. Não dá para dizer que "na maioria dos casos o assassino mata dentro de casa".

Nas 241 páginas do estudo a palavra "violência" é usada 458 vezes, mas "violência doméstica" não aparece uma vez sequer. Já "violência intrafamiliar" e "violência contra a mulher" são usadas apenas uma vez cada, mas a título de notas conceituais. Cerca de dois terços do trabalho dedicam-se a especificar os rumos da violência por Estado, mas não especificamente contra a mulher e, repita-se, mais de 90% dos mortos são homens. 

Em agosto de 2012 foi lançada uma atualização do Mapa da Violência (leia)desta vez com dados específicos referentes às mulheres e, assim como o outro, assinado pelo sociólogo Julio Jacobo Waiselfisz. Aqui sim temos um dado relevante, na página 10, referente às circunstâncias e ao local do incidente que originou as lesões que levaram à morte da vítima:

"
As armas de fogo continuam sendo o principal instrumento dos homicídios, tanto femininos quanto masculinos, só que em proporção diversa. Nos masculinos, representam quase 3/4 dos incidentes, enquanto nos femininos pouco menos da metade. Já outros meios além das armas, que exigem contato direto, como utilização de objetos cortantes, penetrantes, contundentes, sufocação etc., são mais expressivos quando se trata de violência contra a mulher, o que pode ser indicativo de maior incidência de violência passional (...).
Entre os homens, só 14,3% dos incidentes aconteceram na residência ou habitação. Já entre as mulheres, essa proporção eleva-se para 41%". 

Apesar do que está transcrito acima, na página 26 há uma conclusão diferente:

"Os feminicídios geralmente acontecem na esfera doméstica. Em nosso caso, verificamos que em 68,8% dos atendimentos a mulheres vítimas de violência, a agressão aconteceu na residência da vítima; 

É correta a ideia de que o modo pelo qual ocorreram as mortes indica maior violência doméstica contra a mulher, que na maioria são crimes passionais (paixão que mata: paradoxal, não? A pessoa ama a outra e a mata por não aceitar uma separação ou traição, por exemplo... absurdo!). Só que do jeito que está a conclusão tem-se a impressão de que em 69% dos homicídios de mulheres a agressão tenha ocorrido na residência. Mas observe que o texto começa falando em "feminicídio", mas chega aos 69% tendo por base os "atendimentos a mulheres", no que se refere aos atendimentos no SUS, tenham elas resultado em homicídio ou não: as informações que estão nas páginas 18 a 24 do citado estudo (confira).

Ou seja: não é possível afirmar que o índice de homicídios ocorridos em decorrência de violência doméstica seja de 69%: os números provados são da ordem de 41% e por tal motivo a frase correta  deveria ser "uma mulher a cada cinco horas(índice ainda lamentável) e não "uma mulher a cada duas horas". Da mesma forma não se pode dizer que a maioria dos assassinos é formada pelos próprios maridos e sim 41% (índice ainda lamentável). Mas o que interessa para muitas pessoas é a notícia alarmante e é por isso que são usados os números que mostrei acima e que não são verdadeiros. 

Não, eu não disse que são bons números: são estarrecedores, infelizmente. Não se pode negar a idiotice de muitos homens nesse aspecto de pensar que são donos da vida de suas parceiras. É claro que 41% de mortes de mulheres e 69% de atendimentos no SUS originando-se de problemas em casa são números muito altos! Bom seria que ambos fossem 0%... 

Conclusão: o alarmismo fica evidenciado porque os números são bem menores do que os divulgados: a base para que se diga que "x" mulheres morrem vítimas de seus maridos simplesmente foi manipulada para dela se extrair tal afirmação, o que é um absurdo. A se usar a mesma metodologia poderemos dizer então que "a cada duas horas 10 homens são mortos no Brasil por suas esposas"...

Se considerarmos o segundo estudo citado, esse sim específico quanto às mulheres, também não podemos chegar à conclusão que ele próprio chegou, porque tratou números de atendimentos no SUS como se fossem números de homicídios: não são 70% das mulheres que são vítimas de homicídios dentro de casa e sim 40%, o que também é um número alto, mas este é um dado provado, ao contrário dos que são repetidos na imprensa e na mídia todos os dias.

Para encerrar, mostro dados que curiosamente nunca são divulgados - talvez por enfraquecerem os argumentos alarmistas - baseados na pesquisa "Mulheres brasileiras e gênero nos espaços público e privado" (fonte aqui), realizada em agosto de 2010 pelo SESC e Fundação Perseu Abramo, ligada a um partido político brasileiro de orientação esquerdista (não são dados "da direita", ok? Rsrsrsrs), de onde foram tirados os gráficos a seguir:

- 74% das mulheres entendem que a situação da mulher hoje é melhor do que há 20 anos (pág. 22);

- 68% das mulheres disseram que não são feministas (pág. 60), enquanto 81% dos homens declararam  que não são machistas (pág. 62)
80% das mulheres entrevistadas disseram que nunca foram agredidas (pág. 231). Entre os homens o número é de 89% (não 100%, como muitos pensam);
- Tanto homens quanto mulheres têm a mesma percepção (ambos em torno de 77%) de que as mulheres têm condições de governar o país/estado/município (pág. 284)
91% dos homens consideram que “bater em mulher é errado em qualquer situação

Estou entre os 91%!

2 comentários:

  1. Texto muito bom, citei um trecho no meu trabalho acadêmico.

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    1. Por incrível que pareça, só vi esse comentário em 03 de agosto de 2016... rsrsrsrs
      Agradeço a citação!

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Então por gentileza identifique-se, não cite nomes de políticos nem de partidos políticos brasileiros, não ofenda ninguém e não faça acusações sem provas.

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