Por trabalhar na Justiça Eleitoral, evito citar nomes de políticos e/ou partidos políticos brasileiros (embora eu pudesse fazê-lo sem problema algum, pois sou um cidadão como outro qualquer: o Código de Ética do TRE/RJ não tem vedação nesse sentido, porque o fato de ser servidor público não retira minha liberdade de expressão).

sábado, 30 de março de 2013

Os números da violência doméstica contra as mulheres no Brasil (parte 1)

AVISOS AOS NAVEGANTES:
1 - Sou contra todas as formas de violência, qualquer que seja a vítima, homem ou mulher. 

2 - Para mim o homem que agride uma mulher baseado na ideia absurda de que ser superior a ela é um idiotamerece encontrar um irmão, pai ou outro parente que diga "bate em mim agora: você não é machão?", para largar de ser covarde: lugar de criminoso é na cadeia.
3 - Ensino meus filhos a serem gentis com as mulheres e que "em mulher não se bate nem com uma flor", além de outras regras de boa educação: desde que o mundo é mundo é assim.
4 - A postagem abaixo é séria. Nela indico todos os links que mostram de onde vêm as fontes citadas e de onde tirei as conclusões apresentadas. Por gentileza leia até o fim antes de emitir algum conceito pré-estabelecido a respeito: em momento algum direi que não há violência contra a mulher.



Os números da violência doméstica 
contra as mulheres no Brasil - I

Uma das coisas que muito se ouve falar na mídia e na internet são as já cantadas e decantadas estatísticas que dão conta de que "
no Brasil a cada duas horas uma mulher morre vítima de violência doméstica", que "dez mulheres são vítimas de violência a cada hora", ou "a cada hora, dez mulheres são vítimas de maus tratos" e coisas assim. 

Sempre suspeitei que fossem dados alarmistas e sem comprovação: será que no mundo em que vivemos isso acontece mesmo desse jeito? Isso reflete a realidade da sociedade brasileira? Ocorre que sem analisar tais dados eu não poderia falar nada, sob pena de ser tão alarmista quanto quem eu achava ser alarmista. Mais adiante mostrarei que os números normalmente divulgados são uma distorção dos números verdadeiros (não posso dizer que por má-fé: talvez seja má compreensão) e vou explicar de onde tirei tal conclusão.

Costumo recorrer à nossa Lei Maior para buscar o significado das coisas, embora saiba que até o Supremo muitas vezes dê a ela a interpretação que melhor lhe couber politicamente (não juridicamente, como deveria ser)
No § 8º do artigo 226 da Constituição não está escrito que o Estado deve proteger a mulher do homem e sim que a violência familiar deve ser coibida, venha de onde vier.  Vejamos:

"O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações".

Assim, se há uma lei para proteger a mulher, deveria haver uma para proteger o homem ou  o que seria mais simples  uma lei que protegesse a PESSOA de agressões dentro de casa, de onde se espera receber carinho, não violência. Destaque-se o fato de que muitos, inclusive algumas autoridades, têm errada ideia do âmbito de aplicação da Lei Maria da Penhaque só deveria incidir nos casos de violência de gênero, que é aquela baseada na absurda ideia de superioridade de um sexo sobre outro: nem toda vez que um homem agride sua companheira a lei em questão deve ser aplicada... em casos outros como de provocações vindas da mulher ou agressões recíprocas por ela iniciadas, nada de Lei Maria da Penha (mas isso não dá ibope...), devendo ser aplicado apenas o Código Penal, porque não se trata de violência de gênero. Leiamos:  

Art. 5o  Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial:
I - no âmbito da unidade doméstica (...);
II - no âmbito da família (...)

Para que ninguém ache que inventei o conceito de violência de gênero, cito a Recomendação Geral 19 do Comitê Cedaw (Comitê da ONU para a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra a Mulher) feita em 1992, conforme nota de rodapé na página 17 da Norma Técnica de Padronização das Delegacias Especiais de Atendimento às Mulheres, da Secretaria de Políticas para Mulheres da Presidência da República:

"A violência baseada no gênero é uma forma de discriminação que impede, seriamente, as mulheres de usufruírem dos direitos e liberdades em igualdade com os homens”. 

O problema aumenta quando as estatísticas começam a ser repercutidas sem parar na internet e na imprensa em geral e até por autoridades e membros do Ministério Público: as pessoas podem acreditar que o Brasil é mesmo assim e sair por aí achando que todo homem é machista, que todo marido bate na mulher, que há uma "epidemia" de violência contra a mulher... 

Interessa a muitas pessoas e instituições (as que vivem dos valores governamentais recebidos) que os dados sejam sempre alarmantes, para demonstrar a necessidade de determinada política e, na esteira, que essas tais instituições são imprescindíveis para a salvação das mulheres brasileiras. Evidentemente eu não disse que não é preciso dar apoio às vítimas de violência doméstica: disse que o "quanto pior melhor" financia muita gente por este país a fora.

Só que eu não costumo me deixar enganar por discursos fáceis. Claro, sempre corro o risco de algum maluco achar que sou a favor de violência contra mulheres, que sou machista e essas coisas que essa turma fala dos outros quando não tem argumentos. Não tolero a violência contra PESSOAS, não importando se são homens ou mulheres. Importava verificar os números. 

Assim, recentemente procurei as informações verdadeiras: seria eu mesmo "machista" como achavam algumas pessoas (machista por não acreditar em dados que eu achava falsos???)? Seriam os homens brasileiros mesmo tremendamente violentos com as mulheres? Nosso país seria mesmo um antro de marginais disfarçados de príncipes encantados? É simples: minha cisma decorre do simples fato de que esses dados não se sustentam pela observação da vida de nossa sociedade. Fui buscar as informações oficiais...

O site da Secretaria de Política para Mulheres mostra as mais variadas pesquisas sobre o universo feminino (veja aqui), mas só uma se refere à violência e, pasme-se, é apenas um levantamento sobre como as pessoas observam a violência contra a mulher (realizada entre 13 e 17 de fevereiro de 2009, retratando "incríveis" cinco dias de informações)Quando se clica para visualizar a pesquisa, rapidamente se conclui que de lá não foi retirado tal dado de "uma morte a cada duas horas".

No site do Ministério da Saúde há uma informação rápida sobre a Lei Maria da Penha e um link que remete... à Secretaria de Políticas para Mulheres: de lá também não surgiu...

Parti para o Google: em 08 de março deste ano a revista Exame replicou reportagem da agência Brasil assinada por Paula Laboissière (veja), onde se lia:

"De janeiro a dezembro de 2012, a Central de Atendimento à Mulher (Ligue 180) contabilizou 732.468 registros, sendo 88.685 relatos de violência. Isso significa que, a cada hora, dez mulheres foram vítimas de maus tratos ao longo do ano passado.

Facilmente se comprova que ninguém pode afirmar que isso é verdade: os dados não mostram o número de vítimas de maus tratos e sim a quantidade de casos relatados à Central de Atendimento. Nada prova que tais fatos efetivamente ocorreram e não há qualquer ligação referente à investigação desses crimes, muito menos condenação dos infratores: há muita subjetividade na afirmação feita pela Exame. 

O que os números mostram é a quantidade de pessoas que relataram tais ocorrências (e não à Polícia, mas a uma central de atendimento por telefone). Assim, não é correto afirmar que "a cada hora, dez mulheres foram vítimas de maus tratos", pois não há qualquer comprovação disso: há uma clara banalização do fato quando se transforma um número relativo em verdade absoluta. Como manchete fica bem chamativa, mas como notícia deixa a desejar.


A continuação desta postagem está aqui:
ficaria muito chata a leitura de um texto tão grande.

3 comentários:

  1. Vale a pena a correção: "nem toda vez que um homem agrede sua companheira..."
    Parabéns pela postagem.

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  2. Ótima abordagem, Marcelo Bessa Cabral. Também acredito que deveria existir uma lei que protegesse a PESSOA de agressões não só dentro de casa mas em todo e qualquer lugar. Todos os dias sofremos agressões (homens e mulheres) e não só físicas, mas verbais, gestuais, de abandono etc. Não gosto muito dessa "coisa" de números, acho que às vezes as estatísticas são muito distantes da realidade.
    Ah, se me permite... o fundo musical poderia ser a música Adorável Gado Novo de Zé Ramalho. Que tal?

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Então por gentileza identifique-se, não cite nomes de políticos nem de partidos políticos brasileiros, não ofenda ninguém e não faça acusações sem provas.

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