No Brasil
moderno as crianças aprendem na escola uma absurda versão da famosa cantiga de
roda “Atirei o Pau no Gato”, que diz “não
atire o pau no gato/Porque isso não se faz/O gatinho é nosso amigo/Não devemos
maltratar os animais/Jamais”. Que graça tem cantar essa música de mãos
dadas, fazer uma roda e não agachar no “miau”, já que este foi retirado da
música? Será que temos o direito de tirar isso da infância de nossas crianças
algo que usufruímos tão prazerosamente em nossa própria infância? Devemos
recriminar as vovós que – evidentemente – cantam a versão original para seus
netinhos???
Não
é necessário ser especialista em educação infantil para saber que crianças
interpretam as coisas literalmente. Mas também não é necessário muito esforço
para saber que exatamente com as cantigas de rodas que há gerações fazem parte
do domínio popular tem-se uma excelente chance de mostrar para as crianças que
não se pode interpretar literalmente o que se ouve. Engraçado: as pessoas que
inventam essas teorias malucas cresceram ouvindo... “Atirei o Pau no Gato”!!!!
Como pode?
A ser assim, algumas perguntas se apresentam: tentarão esses patriotas censurar os aplicativos gratuitos para celulares e tablets – hoje ao alcance de qualquer criança – onde é possível, por exemplo, bater à vontade no gatinho “Tom Falante”? Também será preciso mudar a letra de “Marcha Soldado”, por ser uma “ofensa” chamar o recruta de “cabeça-de-papel”, sob a ameaça de ficar “preso no quartel” se não marchar direito? “Samba-Lelê” precisará ser alterada, por incitar a violência ao dizer que mesmo doente e com a cabeça quebrada “precisava é de umas boas lambadas”? Seria “Boi da cara preta” uma música de cunho racista por associar tal cor ao malvado boi que “pega essa criança que tem medo de careta”? Em “Nana, Neném” dizer que “a Cuca vai pegar” cria trauma nas crianças? Há uma briga em “O Cravo e a Rosa”, onde aquele sai ferido e esta despedaçada: por acaso tal canção ensina às crianças que a violência contra a mulher é normal, já que no fim eles se casam? Reflitamos...
Há
gerações que essas músicas são ingenuamente cantadas por crianças de todos os
lugares!!! Mas no frenesi virtual das redes sociais as coisas se espalham de
forma viral, fazendo com que as versões “politicamente corretas” sejam
difundidas sem que as pessoas se dêem conta do mal que estão fazendo. Será que
a Xuxa de 2015 enquadraria a Xuxa de 2004 na “Lei da Palmada” porque a mãe do
Elefante Trombinha ameaçou lhe dar uma palmada “bem na bundinha”, caso ele não se comportasse? O que se diria hoje
de uma música cujos versos fossem “Comer
tatu é bom/Que pena que dá dor nas costas/Porque o bicho é baixinho/E é por
isso que eu prefiro as cabritas”? Certamente a banda seria defenestrada sob
a acusação de “incitar maus-tratos contra
animais” ou coisa pior, mas seria – como foi nos anos 90 – só besteirol
típico dos Mamonas Assassinas (que as crianças adoravam, por sinal).
O
fato é que na época em que se “atirava” o pau no gato, uma criança enfurecida que
quebrasse a escola era devidamente punida e seus pais se envergonhavam disso.
Hoje em dia os professores deixam de agir por medo de punições e ações
administrativas e judiciais... e os pais ainda posam de vítimas, querendo “processar
a escola” (escola tem que dar só o ensino; quem tem que dar educação é a família):
que cantiga de roda será culpada por isso? Sugiro uma nova versão e espero que
os especialistas gostem: “Atirei o pau no professor/Porque ele é opressor/Já
que o ECA é nosso amigo/Não devemos respeitar nem nossos pais/Jamais!”
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