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sábado, 19 de julho de 2014

O correto uso do papel higiênico, segundo João Ubaldo

Não sou de me dizer fã de uma pessoa quando ela morre, só para parecer "cool": o que falo de alguém em sua morte tem que ser coerente com o que eu falava desse alguém quando em vida.

De João Ubaldo Ribeiro li apenas um livro: "Política: quem manda, por que manda, como manda" (acredite: João Ubaldo era mestre em Ciências Políticas e foi professor de Política na UFB). É um manual sobre Política, mas que deliberadamente não tem uma citação sequer: tudo é obra do pensamento de João Ubaldo, que inventou países como "Ugh-Ugh" e "Xaxulândia" para explicar magistralmente a formação da sociedade e do Estado sem usar os termos rebuscados e incompreensíveis geralmente citados no meio.

A última crônica dele é, como de costume, maravilhosa: "O correto uso do papel higiênico" é um texto absolutamente sarcástico que vai direto na ponta do queixo da ideologia 'politicamente correta'. Trechos:

"I
magino que a escolha da posição do rolo do papel higiênico pode ser regulamentada, depois que um estudo científico (...). E a maneira certa de passar o papel higiênico também precisa ter suas regras (...)"

"Depois de algum debate, em que alguns radicais terão proposto o Cardápio Único Nacional, a lei estabelecerá que, em todos os menus, constem, em letras vermelhas e destacadas, as necessárias advertências quanto a possíveis efeitos deletérios dos ingredientes, bem como fotos coloridas de gente passando mal, depois de exagerar em comidas excessivamente calóricas ou bebidas indigestas."

"Se o pai der umas palmadas no filho, pode ser denunciado à polícia e até preso. Mas, antes disso, é intimado a fazer uma consulta ou tratamento psicológico. Se, ainda assim, persistir em seu comportamento delituoso, não só vai preso mesmo, como a criança é entregue aos cuidados de uma instituição que cuidará dela exemplarmente, livre de um pai cruel e de uma mãe cúmplice. Pai na cadeia e mãe proibida de vê-la, educada por profissionais especializados e dedicados, a criança crescerá para tornar-se um cidadão modelo".

"Não parece estar longe o dia em que a maioria das piadas será clandestina e quem contar piadas vai virar uma espécie de conspirador (...). Cada livro será acompanhado de um texto especial, uma espécie de bula, que dirá do que devemos gostar e do que devemos discordar e como o livro deverá ser comentado na perspectiva adequada, para não mencionar as ocasiões em que precisará ser reescrito, a fim de garantir o indispensável acesso de pessoas de vocabulário neandertaloide."

A morte é um caminho natural na vida. Chegou o momento do grande João Ubaldo Ribeiro, como um dia chegará o de todos nós.

Foi um grande brasileiro esse João Ubaldo!

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